De 10 a 15 de abril deste ano, ocorreu em Melbourne, na Austrália, a 17ª edição da International Bryozoology Association Conference (Conferência da Associação Internacional de Briozoologia), um congresso que, a cada três anos, reúne pesquisadores de várias partes do mundo para apresentar e discutir seus trabalhos sobre briozoários – seres marinhos que formam colônias normalmente muito pequenas, mas que também podem ser grandes, a ponto de serem confundidas com algas ou corais.

Para este evento viajou a estudante de doutorado do Instituto de Biociências (IB) da USP Karine Nascimento, sem imaginar que seria contemplada com o prêmio de melhor apresentação de pôster. "Não passou pela minha cabeça, nem por um milésimo de segundo, ganhá-lo... os outros trabalhos eram muito bons!", surpreendeu-se Karine.


O trabalho apresentado por ela foi o resultado obtido durante o seu mestrado, desenvolvido no Centro de Biologia Marinha (CEBIMar) da USP, sob orientação do Prof. Dr. Alvaro Migotto e da Dra. Karin Fehlauer-Ale. Karine fez análises de DNA em várias populações de Amathia verticillata e mostrou que esta espécie de briozoário distribui-se por quase todo o mundo por conta de sucessivas introduções causadas pelos humanos. "Concluímos que o transporte marítimo foi o responsável pela atual distribuição dessa espécie, levando-a de portos em portos ao redor do mundo, uma vez que as colônias podem viajar aderidas aos cascos das embarcações", explica Karine.

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A pesquisadora Karine Nascimento, durante a 17ª edição da International Bryozoology Association Conference na Austrália, junto ao seu pôster premiado.

 

A pesquisadora também ressalta a importância da consciência ambiental que seu trabalho pode promover: “Atualmente os cientistas têm se deparado cada vez mais com esse tipo de problema. Uma espécie introduzida em um ambiente onde ela não existia pode causar um grande desequilíbrio no local, pois muitas vezes não possui predadores naturais e compete com as espécies nativas, podendo levá-las à extinção. No caso de Amathia verticillata, além desses prejuízos ecológicos, ela também causa prejuízos econômicos, pois suas grandes colônias crescem sobre equipamentos pesqueiros e podem obstruir tubulações marinhas costeiras. Agora é praticamente impossível aos pesquisadores conter a introdução dessa espécie, pois ela já está bem estabelecida em todos os oceanos”.

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Fotografia subaquática de colônias de Amathia Verticillata (estruturas esbranquiçadas ramificadas) crescendo sobre a superfície da estrutura de um píer. Foto: Alvaro Migotto.

O quê ainda intriga Karine e seus colaboradores é saber qual a verdadeira área nativa de Amathia verticillata, ou seja, de onde a espécie surgiu. Novos estudos genéticos envolvendo um maior número de populações de mais localidades pelo mundo poderiam indicar o local, mas essa espécie pode ter sido introduzida tantas e tantas vezes que o sinal genético que daria esta resposta talvez tenha sido perdido.

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Fotomicrografia mostrando o aspecto de Amathia verticillata sob grande aumento óptico. Cada estrutura aparentada com um botão floral, com tentáculos expostos ou não, é um indivíduo da colônia. Foto: Alvaro Migotto.

Atualmente no seu doutorado, também realizado no CEBIMar-USP, Karine vem conduzindo um novo estudo envolvendo um grande grupo de briozoários. “Quase não há estudos sobre esse grupo em que estou trabalhando, chamado Beania, que reúne mais de 75 espécies muito parecidas morfologicamente. A maioria dos trabalhos foi voltada para a descrição das espécies, mas agora quero saber qual é a relação entre elas, ou seja, qual espécie é mais aparentada com qual. É algo bem parecido com o que fazemos ao montar uma árvore genealógica da nossa família, mas como eu não sei qual espécie surgiu primeiro, eu vou usar as características morfológicas e de sequências do DNA para tentar responder essa questão”, disse Karine. “Os resultados dessa pesquisa serão finalizados em meados de 2019, e eu sei que terei muito trabalho até lá, mas estou bem empolgada com esse projeto e alguns resultados preliminares indicam que teremos muitas surpresas para este grupo!”.

Glossário

colônia – tipo de associação biológica em que indivíduos da mesma espécie vivem unidos fisicamente, podendo ou não apresentar divisão de trabalho.

DNA – sigla em inglês do ácido desoxirribonucleico, molécula responsável pela transmissão das características hereditárias dos organismos.

fotomicrografia – técnica fotográfica que cria imagens ampliadas de objetos muito pequenos, usualmente utilizando uma câmera fotográfica acoplada a um microscópio.

morfológico – relativo à forma, ao aspecto; em Biologia refere-se ao estudo da forma de um organismo ou parte dele.

população – conjunto de indivíduos de uma mesma espécie que habitam uma determinada área num determinado período de tempo, podendo trocar material genético entre si.

Para saber mais:

Associação Internacional de Briozoologia: http://bryozoa.net/iba/

Resumo do trabalho de Karine Nascimento no XIX Simpósio de Biologia Marinha: http://www.producao.usp.br/bitstream/handle/BDPI/49769/2735493.pdf?sequence=1