A noção de que a taxa de predação em ambientes marinhos costeiros aumenta em direção aos trópicos já é conhecida há décadas, mas os efeitos desse consumo incremental na estrutura das comunidades ainda são pouco conhecidos.

Publicado na semana passada, o estudo experimental de Ashton e colaboradores (Science, 376: 1215–1219), realizado em 36 locais distribuídos ao longo de 115o de latitude em ambas as costas das Américas, mostra que os efeitos da predação, diminuindo a biomassa e alterando a composição de espécies, aumentam exponencialmente de regiões temperadas frias a regiões tropicais. Essa tendência é melhor explicada pela variação da temperatura média dos locais de estudo. Em um cenário de aquecimento global, o estudo conclui que os efeitos de consumo (processos de regulação descendente) podem tornar-se cada vez mais importantes no controle da dinâmica das comunidades marinhas.

Mapa
Mapa da região de estudo com
a indicação dos locais de amostragem.
Experimento
Experimento para verificar ação dos predadores.

A figura B mostra a manipulação experimental para excluir o acesso de predadores a comunidades que se desenvolvem na face inferior do painel suspenso. Ao fundo uma réplica de exclusão (EX) e à frente uma réplica do controle de procedimento (CP, painel ao qual os consumidores têm acesso, mas ainda exposto a quaisquer alterações ambientais impostas pela cesta usada na exclusão). O controle (CO), não mostrado na imagem, consiste apenas da placa de assentamento, fixada ao tijolo para minimizar o deslocamento.

Comunidades

Comunidades bentônicas resultantes dos três tratamentos.

Na Figura C, vemos que espécies mais vulneráveis à predação, como tunicados solitários (painel intermediário), são mais abundantes quando predadores são excluídos (EX). Painéis expostos à predação (CO: painel esquerdo; CP: painel direito), apresentam menor biomassa e uma prevalência de espécies resistentes, como cracas e briozoários coloniais. 

Enfatiza-se ainda a importância de estudos experimentais padronizados, replicados em grandes escalas espaciais, para testar hipóteses macroecológicas que se sustentam na presente análises de padrões biogeográficos. Ressalta-se ainda que esse tipo de estudo provê contexto ecológico para estudos mais localizados. Agora entende-se melhor os resultados de trabalhos anteriores conduzidos no Canal de São Sebastião, os quais mostravam um incremento muito substancial da diversidade biológica quando a predação era excluída do processo de formação das comunidades. Ainda que esses resultados desafiem a teoria ecológica fundamental, é importante a repetição simultânea de protocolos experimentais padronizados, em diferentes ecorregiões, pois pode ser decisiva para o avanço da pesquisa como um todo.


 Leia o artigo completo:

Ashtonet al. Predator control of marine communities increases with temperature across 115 degrees of latitude.Science376, p. 12151219, 10 June 2022. DOI: 10.1126/science.abc49

Saiba mais:

As the ocean heats up hungrier predators take control: Marine predation intensifies in warmer waters; could reshape ocean communities as climate changes. EurekAlert, 9 june  2022. Disponível em: https://www.eurekalert.org/news-releases/955243

Marine predation intensifies in hotter waters; might reshape ocean communities as local weather modifications. Unitedbitco, June 2022. Disponível em: https://unitedbitco.com/marine-predation-intensifies-in-warmer-waters-could-reshape-ocean-communities-as-climate-changes/


Augusto A.V. Flores é docente do Centro de Biologia Marinha da Universidade de São Paulo, São Sebastião, SP e co-autor do artigo completo.