Localizado próximo à costa de São Paulo, o Arquipélago dos Alcatrazes é um santuário de vida, tanto acima quanto abaixo das águas. Suas águas abrigam vastos jardins de corais que se estendem sobre costas rochosas. O arquipélago é protegido por duas áreas marinhas protegidas (AMPs) onde a pesca é proibida, salvaguardando mais de 1.300 espécies marinhas e terrestres, das quais 20 são endêmicas.
A ONG internacional de conservação marinha Mission Blue anunciou recentemente o Arquipélago de Alcatrazes como um novo Hope Spot. Esse reconhecimento contou com o apoio do Dr. Vinicius José Giglio, professor da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), e do Dr. Ronaldo Bastos Francini-Filho, professor e pesquisador do Centro de Biologia Marinha da Universidade de São Paulo, ambos nomeados como Campeões do Hope Spot.
Segundo a Dra. Sylvia Earle, fundadora da Mission Blue, "O Arquipélago de Alcatrazes abriga mais de 1.500 espécies, incluindo peixes recifais, aves marinhas e cetáceos como golfinhos-nariz-de-garrafa, baleias-jubarte, baleias-comuns e baleias-minke. Também é um lugar onde pessoas colaboram com sucesso na conservação, educação e pesquisa. O compromisso com a proteção do Arquipélago dos Alcatrazes nas últimas décadas nos dá grande esperança de que essa parte excepcional do oceano continue a prosperar."
O Arquipélago dos Alcatrazes possui uma das maiores biomassas de peixes recifais do Brasil e é internacionalmente reconhecido como uma Área Importante para Mamíferos Marinhos. A confluência entre a fria Corrente do Atlântico Sul, rica em nutrientes, e a quente Corrente Brasileira, oligotrófica, favorece a ocorrência de elevada biodiversidade de espécies tropicais e subtropicais. Durante o verão, a intrusão de águas profundas e frias pode proporcionar um refúgio climático para corais afetados pelo aquecimento global, como o coral-cérebro endêmico do Brasil, Mussismilia hispida. Recentemente, duas novas espécies de corais foram descritas no Arquipélago, o coral escleractínio solitário endêmico (Coenocyathus sebroecki) e o Terrazoanthus silveirai.
O coral escleractínio solitário endêmico Coenocyathus sebroecki
"O Arquipélago dos Alcatrazes é um exemplo de sucesso na conservação da biodiversidade, combinado com uma visitação pública bem implementada e um compromisso das partes interessadas e das comunidades locais para apoiar a eficácia das AMPs. Esses esforços resultaram em melhores resultados ecológicos e sociais das AMPs," afirma o Dr. Vinicius José Giglio, Campeão do Hope Spot.
Dr. Ronaldo Bastos Francini-Filho, co-campeão do Hope Spot, complementa: "As AMPs de Alcatrazes são o resultado de um processo genuíno de mobilização local, no qual as partes interessadas lutaram por anos por sua criação e implementação. Foi um privilégio participar dessa luta. Aprendi a mergulhar em Alcatrazes e, após quase três décadas de trabalho na conservação marinha no Brasil, sinto-me privilegiado por agora dedicar a maior parte do meu tempo à pesquisa aplicada para a conservação do Hope Spot de Alcatrazes. Apesar do sucesso das AMPs, ainda enfrentamos muitos desafios, como a alta pressão pesqueira em seus arredores, o aumento da ocupação costeira e a poluição, além das mudanças climáticas aceleradas."
Duas áreas marinhas protegidas foram estabelecidas em 2016 nas águas do arquipélago: a Estação Ecológica Tupinambás e o Refúgio de Vida Silvestre do Arquipélago de Alcatrazes. Uma AMP menor foi criada na década de 1980, e as ilhas permaneceram fechadas ao público por décadas devido a restrições da Marinha do Brasil. A gestão eficaz dessas áreas tem resultado em aumentos significativos na biomassa de peixes recifais, na recuperação de espécies ameaçadas, na manutenção da fauna e flora endêmicas, e na conservação de locais de nidificação de aves marinhas. Esses resultados positivos possibilitaram que as AMPs de Alcatrazes contribuíssem para o transbordamento de recursos naturais para as áreas de pesca vizinhas, levando-as a receber o Prêmio Nível Ouro do Blue Park Internacional em 2022.
As principais ameaças ao Arquipélago de Alcatrazes incluem a pesca ilegal, a sobrepesca nas áreas circundantes, a invasão de espécies exóticas, bem como o tráfego de navios e a poluição, especialmente em áreas costeiras, onde estão localizados a maioria dos berçários de peixes recifais que habitam Alcatrazes. Apesar da vigilância constante, pescadores recreativos e comerciais continuam a realizar operações ilegais, muitas vezes a noite. O coral-sol invasor (Tubastraea spp.) coloniza as encostas rochosas dos recifes de Alcatrazes com velocidade alarmante, exigindo que os gestores locais dediquem recursos e esforços significativos para controlar sua propagação.
O Arquipélago de Alcatrazes também é rico em história cultural, com evidências de ocupação humana por mais de 4.000 anos, incluindo sambaquis, cerâmicas e outras ruínas do período pré-colonial.
As comunidades pesqueiras na região do entorno de Alcatrazes utilizam técnicas tradicionais de pesca em pequenos barcos, como a canoa caiçara, que é reconhecida como patrimônio mundial pela UNESCO. A pesca recreativa é praticada tanto por moradores quanto por visitantes, e a região também atrai grandes embarcações de pesca industrial, que empregam métodos como arrasto, redes de emalhar, espinhéis e armadilhas.
Atualmente, o Arquipélago dos Alcatrazes recebe visitantes para atividades de baixo impacto, como mergulho recreativo, observação de aves e baleias, e passeios de barco, sempre acompanhados por guias treinados que garantem práticas sustentáveis e promovem a educação ambiental ao longo das visitas.
As prioridades de conservação dos Campeões do Hope Spot, Dr. Giglio e Dr. Francini-Filho, incluem a aplicação e gestão eficazes das AMPs de Alcatrazes, a expansão da proteção legal para águas mais profundas e agregações reprodutivas, e a recuperação de áreas rasas e berçários. Eles também pretendem ampliar programas de monitoramento, pesquisa e educação.
Os desafios atuais incluem o controle de espécies invasoras, a mitigação de ameaças nas áreas circundantes das AMPs de Alcatrazes, a compreensão e mitigação dos impactos das mudanças climáticas, e a manutenção de recursos contínuos para a gestão.
Os próximos passos para o Hope Spot incluem o início de pesquisas avançadas sobre o papel de Alcatrazes como um refúgio climático para corais, novas atividades de monitoramento, como o acompanhamento de agregações de tubarões com uso de respiradores de circuito fechado, e a criação de um centro de visitação com várias atividades educativas para conscientizar sobre a importância do Arquipélago dos Alcatrazes para a biodiversidade e o bem-estar humano. Por fim, os indicados articularão parcerias com tomadores de decisão e gestores para aumentar a eficácia do Hope Spot, visando alcançar as metas da agenda da COP 15 da ONU para 2030.
Sobre a Mission Blue
Liderada pela renomada oceanógrafa Dra. Sylvia Earle, a Mission Blue une uma coalizão global para inspirar o aumento da conscientização pública, acesso e apoio a uma rede mundial de áreas marinhas protegidas, conhecidas como Hope Spots. Sob a liderança da Dra. Earle, a equipe da Mission Blue implementa campanhas de comunicação que elevam os Hope Spots ao palco mundial através de documentários, mídias sociais, mídia tradicional e ferramentas inovadoras como o Google Earth. A Mission Blue realiza expedições oceânicas que lançam luz sobre esses ecossistemas vitais e constroem apoio para sua proteção, além de apoiar o trabalho de ONGs de conservação em todo o mundo com a mesma missão.
Sobre a Universidade Federal do Oeste do Pará
A Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA) é uma instituição pública que busca fornecer educação, promover pesquisa e engajar-se com a comunidade no norte do Brasil. Com uma ampla gama de programas de graduação e pós-graduação, incluindo ciências ambientais, biologia, engenharia e humanidades, a UFOPA é reconhecida por seu compromisso com o desenvolvimento sustentável e suas contribuições significativas para a compreensão e preservação da Amazônia. A ênfase da universidade em estudos interdisciplinares e a colaboração com as comunidades locais refletem sua dedicação em enfrentar desafios regionais e promover o bem-estar social e ambiental.
Sobre o Centro de Biologia Marinha da Universidade de São Paulo
O Centro de Biologia Marinha da Universidade de São Paulo (CEBIMar) é um instituto de excelência em pesquisa básica e aplicada em Biologia Marinha e Oceanografia. Sua missão é desenvolver e disseminar conhecimento técnico-científico para informar políticas públicas e programas de educação ambiental, com o objetivo de preservar a biodiversidade marinha e os serviços ecossistêmicos, promovendo o uso racional e sustentável dos recursos marinhos.
Huntley Penniman, Director of Communications
Versão em Português: Ronaldo Francini Filho (CEBIMar/USP)
Fotos: Marcelo Kitahara (CEBIMar/USP)
Versão original em inglês (clique para baixar o pdf)
Veja o vídeo com a Dra. Sylvia Earle anunciando o Arquipélago de Alcatrazes como um novo Hope Spot: https://youtu.be/QxGwixv3Gjw